Prefeito de Imaruí é condenado à perda da função pública

Se não estou enganado, foi no início de 2011 que a vereadora Elina Vieira Roussenq (PMDB) passou a divulgar na rede social Twitter a compra de livros pela secretaria municipal de educação de Imaruí, a qual teria sido efetuada sem licitação, não atendendo a requisitos da Lei nº 8.666/93.

Ora, Elina era apenas uma voz da oposição que alardeava uma denúncia. E oposição faz inúmeras denúncias, geralmente com a intenção de somente prejudicar politicamente quem está no poder. Quase sempre denúncias sem fundamento. E talvez, por isso, o fato não teve repercussão na imprensa. Entretanto, agora, com a decisão judicial sobre o caso denunciado, deve chamar a atenção da imprensa da região.

Em 14/04/10, uma ação popular foi proposta pelo cidadão Roque González Bohora Justino, indicando no polo passivo da ação o prefeito Amarildo Matos de Souza, Eraldo José Raimundo, Dutty Editora e Comércio de Livros Ltda-ME, além do município de Imaruí. Os autos foram apensados posteriormente à ação civil pública proposta pelo Ministério Público daquele município, que indicava no no polo passivo o prefeito Amarildo Matos de Souza (PSD), Rui José Candemil Júnior, Eraldo José Raimundo, Dutty Editora e Comércio de Livros Ltda - ME, Darlan dos Passos e Nelci Maria Pasqualotto. Assunto da ação: improbidade administrativa.

Alegou "o Ministério Público que o processo licitatório nº. 027/2009 que deu origem à inexigibilidade de licitação nº. 001/2009 e o processo nº. 029/2009 que originou a inexigibilidade de licitação nº. 002/2009 não respeitaram os ditames legais, havendo verdadeiro direcionamento da licitação, além de não estarem preenchidos os pressupostos do artigo 25 da Lei 8.666/93, o que, por isso, implicou a prática de atos improbidade administrativa previstos nos artigos 10 caput e incisos I, VIII e XII, e art. 11,
caput, incisos I e IV todos da Lei 8.429/92."

Consta no processo que o "Município de Imaruí contratou, no ano de 2009, com a empresa DUTTY Editora e Comércio de Livros Ltda-ME, mediante dois procedimentos de inexigibilidade de licitação, a compra das coleções de livros "Nossa Gente Nossa Cor, Corpo Enxuto I e II e Caderno Pedagógico Brasilidade", "História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena", no valor de R$ 163.629,00, ao argumento de que a referida empresa possuía exclusividade de fornecimento, fundamentando suas ações no artigo 25, I da Lei 8.666/93."

Ao analisar os fatos, a juíza aponta que para ser possível a contratação sem licitação é necessário: "a) Inviabilidade de competição e; b) a exclusividade da empresa fornecedora devidamente atestada" (art. 25 da Lei 8.666/93). "Ocorre que a inexigibilidade de certame deve obediência, ainda, aos requisitos do art. 26, caput, da Lei n. 8.666/93 e também aos princípios constitucionais da Legalidade, Impessoalidade, Moralidade, Igualdade, Publicidade, Eficiência e Probidade Administrativa impostos à Administração Pública", asseverou a magistrada.

E continuou em sua análise: "Então, são requisitos para a realização de inexigibilidade de licitação, a caracterização da situação de emergência, a razão da escolha do fornecedor e a justificativa do preço.
No caso dos autos, as ilegalidades são gritantes.
Em ambos os processo de inexigibilidade de licitação (Processo 027/2009 – IL 001/2009 e Processo 029/2009 – IL 002/2009), constata-se que o pressuposto fático da inexigibilidade de licitação está ausente, eis que, no caso, era viável a concorrência, visto que as obras literárias escolhidas pela municipalidade não apresentavam singularidade absoluta. Tal assertiva restou comprovada ante a juntada dos documentos de folhas 151/159,onde o Ministério Público, mediante simples conferência na Web, relaciona obras idênticas e similares às adquiridas pelo Município, o que demonstra a possibilidade de aquisição, ou no
mínimo comparação de preços com outros fornecedores, o que não foi realizado."

A juíza ainda observou que, "No caso em espécie, era evidente a possibilidade de aquisição de outros livros e periódicos similares.
Ademais, não restou caracterizada, também, a situação de emergência alegada pelos requeridos, ao argumento de que havia lei municipal obrigando a compra de obras da espécie adquirida.
Importante asseverar que a Lei Municipal nº. 15.265/2010, que exigiu a aquisição de livros sobre obesidade, o que justificaria a compra das coleções "Corpo Enxuto I e II", foi editada apenas no ano de 2010, tendo os fatos acontecido em 2009, caindo por terra a argumentação defensiva."

Abaixo, publico o dispositivo da sentença, conforme segue (para acessar o conteúdo completo, clique aqui):
"Ante o exposto, e por tudo mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTES os pedidos iniciais insertos nesta Ação de Improbidade e na Ação Popular nº 029.10.000258-5, extinguindo ambos os processo com resolução do mérito, forte no artigo 269, inciso I do Código de Processo Civil para:

a) DECLARAR nulos, com fundamento no artigo 5º, inciso LXXIII da Constituição Federal e artigos 1º e 2º da Lei 4.717/65, os procedimentos licitatórios nº. 027/2009 – IL 001/2009 e 029/2009 – IL nº. 002/2009 e, consequentemente os contratos administrativos nº. 52/2009 e 54/2009 ambos do Município de Imaruí.

b) APLICO aos requeridos, individualizadamente, as sanções previstas no art. 12, II e III, da Lei nº 8.249/92, tendo em conta o disposto no parágrafo único do mesmo dispositivo legal (proporcionalidade) nos seguintes termos:

b.1) Amarildo Matos de Souza: Perda da função pública, suspensão dos direitos políticos e proibição de contratar com o Poder Público, ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos e pagamento de multa civil no valor de 01 remuneração percebida pelo cargo de Prefeito Municipal de Imaruí;

b.2) Eraldo José Raimundo: Suspensão dos direitos políticos e proibição de contratar com o Poder Público, ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos e pagamento de multa civil no valor de 01 remuneração percebida pelo cargo de Secretário do Município de Imaruí à época dos fatos;

b.3) Rui José Candemil Júnior: Suspensão dos direitos políticos e proibição de contratar com o Poder Público, ou receber benefícios ou incentivos da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos e pagamento de multa civil no valor de 01 remuneração percebida pelo cargo de Procurador do Município de Imaruí;

b.4) Darlan dos Passos: Perda da função pública, suspensão dos direitos políticos e proibição de contratar com o Poder Público, ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos e pagamento de multa civil no valor de 01 remuneração percebida pelo cargo que atualmente ocupa junto ao Município de Imaruí;

b.5) DUTTY Editora e Comércio de Livros Ltda-ME e Nelci Maria Pasqualotto: Perda dos bens e valores: Perda dos bens e valores acrescidos ilicitamente ao seu patrimônio, proibição de contratar com o Poder Público, ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos e suspensão dos direitos políticos por 05 (cinco) anos, esta última com eficácia apenas em relação à requerida Nelci Maria Paqualotto.

c) CONDENO todos os requeridos nos autos da Ação de Improbidade Administrativa, solidaria e proporcionalmente, no integral ressarcimento do dano ao Erário no valor de R$ 163,629,00 (cento e sessenta e três mil, seiscentos e vinte e nove reais), o qual deve ser corrigido desde a data desta decisão e aplicados juros de mora desde a citação (CC, art. 405), bem como no pagamento das custas processuais, isentando-os dos honorários de sucumbência (Nos termos da Lei 7.347/85, a condenação em honorários advocatícios se restringe à litigância de má-fé, devendo ser então afastada tal condenação imposta ao recorrente na instância ordinária, ainda que o Ministério Público tenha se sagrado vencedor nos autos da respectiva ação civil. Precedentes: Resp. 785.489/DF).

d) CONDENO os requeridos Amarildo Matos de Souza, Eraldo José Raimundo e DUTTY Comercio e Editora de Livros Ltda-ME, nos autos da Ação Popular, solidária e proporcionalmente, no pagamento das custas e honorários advocatícios em favor do Autor Popular Roque Gonzalez Bohora Justino, os quais arbitro em 10% do valor atribuído à causa, tendo em vista o disposto no artigo 20, § 4º do Código de Processo Civil, isentando o Município de tal encargo.

Dê-se ciência desta sentença ao Município de Imaruí e a Ordem dos Advogados do Brasil - seção de Santa Catarina, a fim de que apurem as responsabilidades administrativas dos servidores e profissionais liberais alcançados por esta decisão, na forma do artigo 15 da Lei 4.717/65.

Comunique-se o Relator do Agravo de Instrumento nº. 2011046180-0 sobre a prolação desta sentença de mérito.

Traslade-se, na íntegra, esta sentença nos autos da Ação Popular nº. 029.10.000258-5.

Após o transito em julgado comunique-se o Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina.

Sentença sujeita ao reexame necessário por força do art. 475, inc. I do Código de Processo Civil.

P. R. I.
Imaruí (SC), 17 de abril de 2012.
Maria de Lourdes Simas Porto Vieira
Juíza de Direito"
Dessa decisão cabe recurso, e bem por isso o prefeito não deverá ser afastado do cargo antes de terminar seu mandato. Entretanto, a decisão monocrática poderá prejudicar suas pretensões políticas em ser reeleito prefeito de Imaruí.

3 comentários:

  1. Estar no mandato de prefeito não significa soberania, estatus, poder absoluto, significa responsabiladade sobre os interesses de todo os cidadãos e não se pode desrespeitar as leis que regulam a administração pública. Ser irresponsável é desrespeitar as leis e as próprias leis eliminam este tipo de detentor de mandato.

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  2. Na época dessa compra sem licitação, alertamos para a irregularidade, fomos mais além, visitamos as escolas, conversamos com os pais, e para nossa surpresa bem poucos tiveram acesso aos livros. Acredito que essa condenação é apenas o início de uma série de outras mais, pois, enquanto estivermos na câmara,na condição de vereadores do PMDB (eu e o vereador Vando) haveremos de denunciar todos os atos ilegais que tivermos conhecimento, pois, essa é a função da Casa Legisaltiva. No caso da condenação do prefeito, vimos que todos aqueles que compactuaram com o crime também estão sendo punidos. Isso, de certa forma também nos dá a certeza de que aqueles que contavam com a impunidade, por serem apenas co-partícipes do crime, estão sentindo na pele o gosto amargo da pena também atribuídas à eles e, quem sabe, passarão a ter mais cuidado e mais zelo pelo dinheiro público. O povo de Imaruí esperava por essa condenação, e, de certa forma, sentimo-nos fortalecidos pelo resultado do nosso trabalho, ao ver que hoje contamos com um Ministério Público atuante no municipio e uma Justiça implacável com aqueles que se desviam da Lei.

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    1. Lendo toda a sentenca para poder publicá-la no blog, fiquei boquiaberto com o caso. É de se estranhar que os atos administrativos que originaram a denúncia e a sentença tivessem sido efetuados com tanto desleixo.

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