Entrevista com Samara Lima Arar: a dor de uma mãe


A entrevista que você vai ler, agora, iniciou-se em maio. Eu mantive contato com o marido de Samara, porque soube que eles estavam indignados com as versões dadas pela imprensa local, que não eram de acordo com os fatos que culminaram no acidente que tirou a vida de seu filho.

Seu marido ficou de manter contato, mas nunca deu resposta. Certo dia, meses depois, recebi uma ligação de Samara, que afirmou ter interesse na divulgação de sua versão. Samara disse que só ligou depois que ouviu uma entrevista de Jarlene J. B. Fernandes a um programa de rádio, na qual falou sobre o suicídio de seu marido e as subvenções sociais. Nessa entrevista, Jarlene comentou sobre a matéria publicada neste blog.

Todas as respostas nesta entrevista foram remetidas por email.

Samara, você reclamou que não teve espaço na mídia para falar do acidente de trânsito que tirou a vida de seu filho. Quais meios de comunicação você procurou? Quais justificativas apresentaram para que não publicassem sua versão sobre os fatos? A versão que foi divulgada na imprensa representou a veracidade de como ocorreu?

Acho que na verdade procurar não é a palavra certa, pois, naquele momento, e também agora, não queremos sensacionalismo, apenas a verdade.

Não procuramos e nem fomos procurados. Apenas tentamos esclarecer os fatos.
O acidente que tirou a vida do meu filho aconteceu dia 19/11/11, num sábado. Na segunda-feira, a Rádio 89.3, ao dar o boletim policial, falou sobre o acidente. O repórter falou a respeito do fato e disse uma frase que deixou a nossa família indignada: “... Ainda não se sabe quem é o culpado...”
Minha mãe ligou para a rádio e desabafou pedindo justiça.
Culpado? Será que não está claro? Quem estava claramente alcoolizado?
O boletim da polícia é passado na rádio duas vezes pela parte da manhã. De novo, falaram o que supostamente tinha acontecido e relataram que o outro carro vinha do sentido centro.
Meu marido ligou para a rádio e disse que não queria falar no ar, porque ainda encontrava-se abalado, e explicou como realmente aconteceu a colisão.
Algumas horas após, o locutor da rádio pediu para meu marido entrar em contato com eles, pois havia uma testemunha que tinha visto o acidente e declarou quem realmente teve culpa.
Meu marido e minha mãe foram até lá. Na rádio, disseram para eles - para meu marido e minha mãe - que a pessoa tinha visto o acidente, mas tinha medo de aparecer. Foi quando a minha mãe falou que tudo bem, que não importava, pois somos pobres, mas não temos medo e vamos lutar pela justiça.
Ela disse isso porque, no dia seguinte ao acidente (domingo), ficamos sabendo que da parte da família deles tinham dito a seguinte frase: “Eles são uma família pobre, não vão fazer nada”.
Pobre não tem sentimento? Uma criança inocente falece e eles acham que fica assim, tudo bem?
Outro fato que achamos estranho foi que o nome da nossa família foi amplamente divulgado e o nome da outra parte, não, por quê?

O jornal Popular também publicou uma reportagem a respeito do acidente. Ao lermos a reportagem observamos alguns erros, pois foram divulgados fatos que não haviam acontecido. Por exemplo, que o bebê tinha sido arremessado pelo vidro frontal do carro, caindo no chão.
Fomos atrás, ao jornal, para esclarecermos os fatos. A pessoa responsável pela reportagem disse que quem tinha passado as informações teriam sido os bombeiros. Só que ao perguntarmos o nome de quem tinha passado as informações, fomos informados de que a repórter não sabia quem tinha sido.
Fica mais uma pergunta entre tantas outras. Um jornalista, ou qualquer outro profissional, não precisa obter suas informações de uma fonte altamente segura e identificada para poder publicar uma notícia dessa importância?

Mas outra coisa que aconteceu foi o seguinte: no dia 1º.04.12, o meu lindinho estaria fazendo 1 ano de idade, se não fosse tirado de nós de uma forma tão brutal.
Fizemos (escrevemos) uma homenagem para ele e pedimos para o jornal (Popular Catarinense) publicar.
O jornal não publicou a homenagem porque disse que a mesma estava muito acusativa. Esta homenagem não tinha nomes e nem nada ofensivo, apenas expressava a verdade e nosso sentimento de dor.
Onde está a nossa liberdade de expressão?

Essa pessoa que teria visto tudo, conforme disse o locutor da rádio, apareceu, testemunhou à polícia?

Não, a pessoa não apareceu e, consequentemente, não testemunhou.

Qual sua versão sobre o acidente?

No dia 19/11/11, perto das 23h00, eu e meu marido, Maurício, saímos de casa para fazer nosso filho dormir, pois, quando ele estava muito agitado, sempre o colocávamos no carro e dávamos uma voltinha que ele dormia. Nesse dia, ele tinha mamado e estava muito agitadinho.
Então, saímos de carro para fazê-lo dormir (moramos no Paes Leme). Maurício, na frente, dirigindo. Eu, atrás, do lado direito, e, nosso filho, no bebê-conforto, do lado esquerdo. Seguíamos pela Av. 21 de Junho, sentido Paes Leme-Loteamento Village. O acidente ocorreu em frente à empresa Manuchar.
Lembro-me que em questão de segundos, antes do acidente, nosso filho começou a chorar e se jogava para eu lhe pegar. Lembro-me que o confortei em meu colo, com a cabecinha dele encostada no peito. Lembro-me, ainda, que ele puxou o cinto de segurança do banco da frente e começou a brincar.
De repente, vejo uma luz muito forte em nossa frente, e escutei meu marido dizendo “meu Deus!”. Foi quando ele jogou o nosso carro para o lado esquerdo, para desviar, e o outro motorista jogou junto; foi uma coisa muito rápida. Eu, na hora, não conseguia respirar, mas enxergava  tudo. O meu marido desmaiado na frente. Eu não via meu filho. Vi o carro preto que bateu na gente, do outro lado da pista.
De repente, consegui respirar e comecei a berrar pelo meu filho, quando vem um senhor que viu tudo e nos ajudou.
Eu gritava muito pelo meu filho, quando uma pessoa perguntou para mim se eu estava grávida e de quantos meses. Respondi que não, que meu filho estava dentro do carro, mas eu não estava enxergando ele. Eu não conseguia me mexer. Foi quando o senhor abriu a porta do meu marido, do lado esquerdo, e retirou o Maurício, e, em seguida, tirou o bebê-conforto. O meu filho encontrava-se na parte de trás, comigo, aos meus pés. O homem o pegou por baixo dos bracinhos, com a cabecinha para baixo. Ele gemia um pouco, e tinha muito sangue na cabecinha.
Em seguida, chegaram os bombeiros. As pessoas que nos ajudavam berravam para que os bombeiros levassem o meu filho, pois o estado dele era muito grave.
Lembro, também, que meu marido estava meio perdido, de vez em quando ele perguntava o que tinha acontecido e aonde estava o nosso filho.
Logo em seguida, os bombeiros me retiraram do carro e me encaminharam para o hospital.
Mas o tempo todo eu perguntava pelo meu filho, e pedia para que eles chamassem a minha mãe para cuidar do meu filho.
Quando cheguei no hospital, levaram-me para a sala de Raios-X, e eu sempre perguntando pelo meu filho, e eles me respondiam que meu filho estava sendo cuidado em outro setor.
Enquanto eles faziam radiografias em mim, a pessoa que provocou o acidente berrava, podre de bêbado, vomitando o hospital todo. Isso fora da sala em que eu estava.
Lembro que tinha uma senhora no setor de Raios-X, e ela me perguntava como tinha acontecido tudo.
Ela me falou que a pessoa que provocou tudo estava podre de bêbada.
Depois de tudo isso, me levaram para uma salinha da emergência, onde já se encontrava a minha mãe. Eu perguntava para ela aonde estava o meu filho, como ele estava.
Ela não queria demonstrar nada para mim, mas não deu para esconder.
Depois, o médico que estava de plantão naquele dia deu-me a pior notícia da minha vida. Disse que não teve como salvar o meu filho.
Meu Deus!, a minha vida, depois desse dia, mudou completamente, e o que me revolta é que nada foi feito. Para as pessoas tanto faz.

A gente não precisava estar passando por isso. Eu perdi o meu filho por uma irresponsabilidade de uma pessoa bêbada.
Peço uma coisa, mas se não querem nos ajudar tudo bem.  Mas não mudem os fatos, pois não foi o filho de vocês que estava ali dentro daquele caixãozinho, MEU DEUS! SÓ QUEM PERDE, SABE A DOR QUE FICA EM NOSSOS CORAÇÕES.

Esses são os fatos reais, sem nenhuma mentira.
Escutamos cada versão que não sei como que podem inventar tanta mentira.
Eu não estava na frente (até porque, se estivesse na frente, eu tinha morrido), a gente não estava indo para casa noturna nenhuma, como chegaram a comentar. Essa foi a mais absurda que eu escutei. Não foi um caminhão que causou o acidente e o meu filho não foi parar fora do carro (tenho pessoas para provar)...
Quanto a nós? Ficamos sem o nosso filho que amamos tanto, sem poder fazer nada... Esperando só pelo o que é certo.

Você afirma com convicção que o condutor do automóvel que teria provocado o acidente estava "bêbado". Você até comentou alguns fatos que ocorreram no hospital a respeito dessa condição física do motorista. Mas por que sua certeza em afirmar isso?

Afirmo isso com muita certeza e convicção por diversos motivos.
1º - Uma pessoa em suas condições físicas e mentais não dirige da maneira como ele dirigia;
2º - Ele se negou a fazer o teste do bafômetro, enquanto meu marido se ofereceu para fazer, mas a polícia não fez;
3º - Como já mencionei anteriormente, as atitudes que ele teve no hospital (gritando,vomitando...);
4º - Além da nossa certeza, também, tem os depoimentos das testemunhas, que declaravam o alto odor etílico que vinha dele, e muito claramente o depoimento da enfermeira do SAMU, que, ao fazer os procedimentos, perguntou se ele tinha bebido? E ele respondeu “SIM, BEBI, BEBI MUITO”...

Você disse que seu marido "jogou o nosso carro para o lado esquerdo para desviar, e o outro motorista jogou junto, foi uma coisa muito rápida". O motorista do outro veículo estava na contramão? Você ou seu marido viu de onde ele surgiu?

Sim, o  motorista estava na contramão, na hora da colisão.
Sim, meu marido viu ele vindo do sentido Nova Brasília - antiga Hipermodal (atual Manuchar).  Ao entrar no trevo, ele vinha em alta velocidade, invadindo a nossa pista de direção.

Você disse que "um senhor que viu tudo" socorreu vocês. Como sabe que ele viu tudo? Vocês mantiveram contato com ele, posteriormente?

Porque ele seguia atrás de nós, e nos relatou que iria nos ultrapassar, pois estávamos em baixa velocidade, mas não ultrapassou porque não estava com pressa e estava perto de casa. Foi ele quem tirou o meu marido e meu filho de dentro do carro, e porque ele relatou como realmente aconteceu tudo, tanto é que ele é a nossa testemunha ocular. Mantivemos contato com ele e sua família, eles compareceram no velório do meu filho, e, do mesmo modo que a nossa família, eles não se conformavam com o que tinha acontecido.

O condutor do veículo envolvido no acidente ou algum familiar dele entrou em contato com vocês? Se não contatou, você ou seu marido esperava algum contato deles? Esse contato minimizaria seu sofrimento?

Não. Esperávamos pelo menos um ato de humanidade da parte deles. Sabemos que foi um acidente, mas provocado por uma pessoa inconsequente, que dirigia bêbada.
Na verdade, minimizar acho que não. Mas, como disse anteriormente, mostraria o sentimento de solidariedade, que é normal entre as pessoas em situações como essa.
Gostaria também de ressaltar que quem morreu foi meu filho, um ser humano inocente. Mas para eles parece que não morreu ninguém e não aconteceu nada.

A perda de um filho causa um sofrimento indescritível para uma mãe que o amava e você não precisa falar sobre isso, pois os leitores devem pelo menos imaginar essa dor. Mas o que lhe causa mais sofrimento hoje, além da saudade?

Como você disse, a falta é enorme e a cada dia que passa aumenta mais. Muitas coisas causam sofrimento: o descaso da outra família; “o poder do dinheiro”; a falta de realização de alguns procedimentos legais; e o fato de quererem reverter a situação, colocando a culpa em nós. Principalmente, a falta de justiça.

Um comentário:

  1. Meu nome é Samara e eu nunca passei pelo que esta mãe passou mas senti como se tivesse sido eu, me senti triste, angustiada, e chocada com o que ocorreu com esta família e com este lindo bebê, este Brasil esta cada vez pior, e quero dizer para esta família, Deus sabe o que faz, de repente no futuro ele não teria uma vida boa e feliz, a cada ano que passa as coisas mudam e ficam pior a policia, hospitais, as ruas e etc... Mas Saiba que para onde ele foi é muito melhor do que aqui, você é nova tem tempo ainda você pode ter mais filhos, com a perda deste você terá um amor tão forte quanto tu tinhas por esse que perdeu, saberá como cuidar, e aprendera muito com outros filho cada um é diferente do outro. Desculpe se escrevi algo que te deixou triste ou que não gostasse, que Deus abençoe você sua família e todos que estão triste e que ele possa consolalos.

    ResponderExcluir

Seu comentário não será exibido imediatamente.

Para você enviar um comentário é necessário ter uma conta do Google.
Ex.: escreva seu comentário, escolha "Conta do Google" e clique em "postar comentário".

Caso você deseje saber se seu comentário foi respondido ou se outros leitores fizeram comentários no mesmo artigo, você poderá receber notificação por email. Para tanto, você deverá estar logado em sua conta e clicar em Inscrever-se por email, logo abaixo da caixa de comentários.

Eu me reservo ao direito de não aceitar ou de excluir parte de comentários que sejam ofensivos, discriminatórios ou cujos teores sejam suspeitos de não apresentar veracidade, ainda que o autor se identifique.

Comentários que não tenham qualquer relação com a postagem não serão publicados.

O comentarista não poderá deletar seu comentário publicado sem que haja justificativa relevante. Caso proceda assim, republicarei o teor deletado.


As regras para comentar neste blog poderão ser alteradas a critério do editor, o qual também poderá deletar qualquer comentário publicado, mediante justificativa relevante, sem prévio comunicado aos leitores/comentaristas.

Você assumirá a responsabilidade pelo teor de seu comentário.
Este espaço é livre e democrático, mas exerça sua liberdade com responsabilidade e bom senso!

LinkWithin

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...
Copyright © 2012 Pena Digital.