Emacobrás tenta rescindir contrato da época de João Rimsa

A Emacobrás Imóveis Comércio e Serviços Ltda tenta rescindir um contrato de venda de 70 lotes no Loteamento Granja Henrique Lage, pois, segundo ela, o comprador teria se obrigado contratualmente a instalar a infraestrutura nessa parte em que se localizam os lotes.

Enquanto a Emacobrás está na mira do Ministério Público, que através de uma ação civil pública cobra da empresa a infraestrutura total no loteamento, que até hoje não se concretizou, os moradores estão a ver poeira e, em alguns casos, a escuridão.

O Município de Imbituba, por sua vez, omisso como sempre se fez diante do caso, permitiu que os lotes fossem vendidos e neles construídos, e não agiu com firmeza contra a Emacobrás, que doava um terreninho aqui, outro ali, num jogo de compadres. A exceção dessa realidade é uma ação milionária intentada pelo município na tentativa de cobrar impostos devidos há muitos anos.
Os proprietários, que se fixaram sem se preocupar com as obrigações da empresa, agora ficam no meio do fogo cruzado judicial.

Com referência aos tais 70 lotes, a Emacobrás, então, "ingressou com 'ação de rescisão contratual com pedido de reintegração de posse', sob o n. 030.12.005412-4, contra Margarita Aldona Miniauskas Beleskevich, alegando que a requerida adquiriu, por herança, vários lotes do Loteamento Granja Henrique Lage", comprados por seu tio, o histórico Dr. João Rimsa.

A empresa "aventou que de acordo com a cláusula 05 do referido contrato o adquirente original (Nelson Pereira) se obrigava a executar todos os serviços de infraestrutura previstos no projeto do Loteamento aprovado. Sustentou que quando da transferência à requerida (herdeira Margarita) esta cláusula foi mantida e, em consequência, foi concedido abatimento no valor de mercado dos lotes."

"Informou que a obra encontrava-se sobrestada pela ação civil pública n. 030.98.002574-5 e que fora notificada para dar cumprimento nas obras de infraestrutura do loteamento. Alegou que a requerida (Margarita) iniciou as obras em relação à parte hidráulica, de modo que reconheceu a sua obrigação no cumprimento do previsto em contrato, o que até o momento não ocorreu."

"Relatou que notificou a demandada (Margarita) e concedeu prazo para o seu cumprimento ou o equivalente em dinheiro, devidamente atualizado, sob pena de rescisão contratual."

Assim, a Emacobrás ajuizou ação para rescindir o contrato e receber de volta os lotes vendidos por Nelson Pereira a João Rimsa e herdados por Margarita.
Ocorre que a empresa não conseguiu seu intento no Juízo da Comarca de Imbituba, pois a magistrada entendeu que Margarita era parte ilegítima para figurar no polo passivo da ação e "extinguiu o feito, sem julgamento do mérito, nos termos do artigo 267, I, do Código de Processo Civil."

"Irresignada com a prestação jurisdicional entregue, a requerente apresentou recurso de apelação (...) repisando os fatos narrados na peça exordial e aduzindo que a requerente (Emacobrás) prometeu vender os imóveis a Nelson Pereira e este, por sua vez, prometeu vender aos tios da requerida com anuência da requerente, não sendo, portanto terceiros, ficando mantida a obrigação contida no contrato no que tange às obras de infraestruturas a ser realizada pelos adquirentes do imóvel."

"Quando da morte dos tios da requerida esta recebeu os bens por herança restando a obrigação mantida no contrato, devendo ainda ser observado o contido na cláusula 06 do referido pacto o qual prescreve que as obrigações nele contidas devem ser cumpridas não só pelos contratantes, mas também pelos seus herdeiros ou sucessores."

A Emacobrás "alegou a ocorrência de sub-rogação da obrigação dos tios na pessoa da sobrinha/requerida, única herdeira, de modo que considerando que o contrato nunca fora cumprido pelos antecessores e os ônus e bônus decorrente de tal contratação foram transferidos com a herança para a requerida, pode o contrato ser rescindido por inadimplemento, conforme pleiteado na peça exordial."

"Versou ainda sobre o direito das sucessões e da responsabilidade dos herdeiros, requerendo, por fim, o conhecimento e provimento do presente reclamo para reformar a decisão de primeiro grau.
Os autos ascenderam a esta Corte", relatou o desembargador Saul Steil, que em sua análise discorreu:

"Analisando os autos, observo que a requerida/apelada adquiriu os direitos inerentes ao compromisso de contrato de compra e venda firmado entre Nelson Pereira e esposa com João Rimsa e sua mulher Paulina B. Rimsa, estes últimos compradores e tios da requerida, por meio de carta de adjudicação na qualidade de única herdeira, dos então compradores, conforme demonstram as certidões dos imóveis colacionados (...).
É cediço que ao herdeiro não cabem tão somente os bônus da herança, mas também os ônus, consistentes em dívidas e obrigações, por certo, até o limite do valor da herança."

"Esta é a dicção do artigo 1.587, do Código Civil de 1916, aplicável ao caso dos autos:
Art. 1.587. O herdeiro não responde por encargos superiores as forças da herança; incumbe-lhe, porém, a prova do excesso, salvo se existir inventário, que a excurse, demonstrando o valor dos bens herdados."

"Vale lembrar que a empresa apelante firmou contrato de promessa de compra e venda de 70 (setenta) lotes com Nelson Pereira, conforme cópia acostada (...), oportunidade em que o então adquirente assumiu o compromisso, além do pagamento em dinheiro -- o qual não é objeto de discussão no presente feito --, de executar, por sua conta, as obras de infraestrutura referente às quadras e ruas dos lotes então adquiridos."

"Os mesmos 70 (setenta) lotes foram transferidos por meio de contrato de compra e venda (...) aos tios da requerida/apelada, oportunidade que também assumiram o mesmo compromisso, qual seja, o de executar todos os serviços de infraestrutura previstos no projeto de loteamento aprovado, relativamente à área do imóvel objeto do contrato, conforme descrito na cláusula de n. 05 (...)."

"Diante de tal quadro, tem-se que a requerida/apelada, na qualidade de herdeira, sucedeu seus tios nos direitos e obrigações, de modo que possui por isso legitimidade para figurar no polo passivo da presente demanda."

"Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery ao versarem sobre o tema ensinam que "os bens da herança respondem pelas dívidas do de cujus. Não se trata de responsabilidade pessoal dos herdeiro, mas de sujeição do patrimônio do devedor para o pagamento de suas dívidas". (Código Civil Comentado. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 969)"

"É de se observar ainda que o contrato em que figurava os tios da ora requerida/apelada contém cláusula aduzindo que "o contrato não só obriga os contratantes, mas também seus herdeiros ou sucessores, na conformidade com o estabelecido no Livro IV do Código Civil e na Lei 6.766/79"."

"A lei acima mencionada, n. 6.766/79, dispõe sobre o parcelamento do solo urbano e dá outras providências, sendo que em seu artigo 29 prescreve que:
'Art. 29. Aquele que adquirir a propriedade loteada mediante ato inter vivos, ou por sucessão causa mortis, sucederá o transmitente em todos os seus direitos e obrigações, ficando obrigado a respeitar os compromissos de compra e venda ou as promessas de cessão, em todas as suas cláusulas, sendo nula qualquer disposição em contrário, ressalvado o direito do herdeiro ou legatário de renunciar à herança ou ao legado.'
Assim, aos herdeiros cabem respeitar e cumprir as obrigações deixadas pelo de cujus, até o limite da herança, situação que deve ser analisada, em seus pormenores, quando do mérito da demanda."

"Em que pese o respeito ao entendimento proferido em primeiro grau, não há como pretender que a requerente/apelante demande contra aquele com quem contratou primitivamente, tendo em vista que este há muito transferiu as obrigações contidas naquele instrumento, inclusive com a anuência da própria requerente."

"Ademais, permitir que a requerida/apelada não responda pelas obrigações que lhe foram transferidas por causa mortis, seria permitir até mesmo o enriquecimento sem causa, já que apenas se beneficiaria com a herança e deixaria um credor sem ver cumprida a sua obrigação que era de responsabilidade dos falecidos."

"Friso que a análise do direito invocado pela apelante/requerente é questão de mérito, restringindo-se o presente apelo tão somente na análise da legitimidade passiva, a qual resta reconhecida."

"Diante de tal quadro, a desconstituição da sentença ora objurgada é medida que se impõe, de modo que dou provimento ao presente apelo recursal.
Consigno ainda da impossibilidade de julgamento imediato do feito nesta seara ad quem, conforme preceitua o artigo 515, §3º, do Código de Processo Civil, tendo em vista que a instrução processual não fora concluída, e a parte contrária sequer fora citada, de modo que os autos devem retornar à Comarca de origem para o seu regular prosseguimento.
Por oportuno, consigno que o juiz não está obrigado a pronunciar-se sobre a integralidade do deduzido na pretensão judicial quando houver nos autos elementos suficientes à dicção do direito."

A decisão integral poderá ser lida aqui.
Leitor, os moradores do Loteamento Granja Henrique Lage, ao que parece, continuarão por muito tempo sem pavimentação de suas ruas e toda a infraestrutura devida, obrigações essas que são da Emacobrás. E não duvido que futuramente o Município de Imbituba - nós - tenha que desembolsar e realizar as obras necessárias.

(observação: texto original sem grifos)

2 comentários:

  1. Quando ainda em atividade e lotado na cidade de Igrejinha no Vale do Paranhana, certo dia fui convidado a tomar um café com o Prefeito, Roberto Argenta, proprietário da indústria de calçados Beira Rio. Discutimos a situação de loteamentos, alguns às margens do rio e outros nas encostas. Perguntou-me ele havia o que fazer. Respondi que sim. Perguntou-me então o que eu precisava tendo respondido que muito pouco. Doa dia seguinte até a conclusão do inquéritos recebemos um computador, impressora, papel e até mesmo um carro durante o expediente para diligências e intimações. Conclusos os inquéritos com fundamento na Lei do Parcelamento do Solo Urbano aposentei-me. Resultaram vários loteadores condenados a penas de reclusão. Hoje tenho alguns amigos que me disseram que de lá para cá a farra dos loteamentos acabou. Óbvio que alguns que foram condenados quando eventualmente vou aquela cidade não mais me cumprimentam. Os deslizamentos periódicos que ocorrem no Rio de Janeiro matando gente são em minha modesta opinião culpa dos Prefeitos, pois o povo elege safados e desqualificados a Prefeitos. Tal cargo exige preparo sob pena de ocorrerem problemas como esse aí enfrentado e que em última análise como dizes resultarão em custos aos contribuintes.

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    1. Jorge, quando o tema é legislação, o índice de desconhecimento por parte da população é alto. A lei de parcelamento de solo não é uma aberração. É algo de extrema utilidade para que não se permita que a cidade cresça desordenadamente. E nesse quesito Imbituba apresenta situação crítica. São vários loteamentos clandestinos, cuja clandestinidade é ignorada pelos que adquirem lotes nessas áreas e depois reclama quando o Poder Público tenta impedir a edificação de imóveis e instalação de água e luz. A consequência da omissão do Poder Público é a conta a ser paga por todos, se a infraestrutura não for financiada pelo loteador. E quem compra os lotes vai exigir depois da prefeitura essa infraestrutura e vai xingar o prefeito. E até os vereadores são cobrados, como se fossem os culpados pela falta de cuidado desses proprietários de lotes. Complicado!

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