"Pequenos traficantes"

No início deste mês, o ex-secretário nacional de Justiça e de Assuntos Legislativos, e então novo secretário nacional de Políticas sobre Drogas, Pedro Abramovay, concedeu entrevista ao jornal O Globo defendendo penas alternativas para pequenos traficantes, ou seja, nada de prisão. Segundo ele, são indivíduos que atuam no tráfico para sustentar o próprio vício. O fato causou polêmica. Afinal, leitor, o que seria um "pequeno traficante"?

Antes de responder à pergunta, vamos a dados fornecidos pelo secretário. Mais da metade dos 70 mil presos por tráfico de drogas nos últimos 4 anos seriam "pequenos traficantes" (40 mil).

Com referência ao crack, o secretário disse que o problema, "muitas vezes, é localizado em regiões, caso da Cracolândia, em São Paulo. Temos de fazer com que se direcionem as políticas para aquelas regiões"
Discordo do secretário quando diz que o problema do crack é "localizado". Pode-se dizer que é "localizado" em quase todo o Brasil, e essa explosão do consumo ocorreu durante os últimos anos, por falta de uma política pública de enfrentamento ao problema. O governo Lula parece ter ignorado a situação.

Segundo o referido secretário, o Ministro da Justiça vai propor aos governadores "um Gabinete de Gestão Integrada para o combate ao tráfico de drogas, onde você vai ter as polícias Militar, Civil, Federal se reunindo periodicamente e estabelecendo estratégias com compartilhamento de informações".

Vamos, agora, à resposta para a questão acima. Definir "pequeno traficante" não é tema fácil - ou impossível. O vendedor de droga só poderia receber pena de prisão se fosse detido com qual quantidade de crack, por exemplo? Meia dúzia de pedras? Uma dúzia? Vinte? Cinquenta?

É sabido que o tráfico está disperso. Não existe mais a situação de um traficante que vende para uma cidade ou região da cidade. Existem vários traficantes que distribuem por todas as cidades, cuja droga é vendida por dezenas, centenas, milhares - dependendo do tamanho populacional do município - de indivíduos ligados ao tráfico. Ora, diante dessa organização distributiva, não colocar na prisão os "pequenos traficantes" é descriminalizar o tráfico. Raramente alguém será preso com grande quantidade no bolso ou na casa.
Essa descriminalização, ao contrário do que muitos defensores pensam, não fará diminuir o consumo, nem talvez se reduza a violência.

Mas veja bem o que está escrito no 4º parágrafo deste artigo: "Gestão Integrada para o combate ao tráfico de drogas". O Brasil está pensando nisso. O país já é um dos principais consumidores de droga, mas não possui uma política eficiente de combate a entorpecentes, nem sequer uma "gestão integrada" entre as polícias. Frente a isso, diante da incompetência estatal, vamos descriminalizar o tráfico. Brilhante ideia!

Voltemos ao agora ex-secretário nacional de Políticas sobre Drogas. Sim, ex-secretário, pois já está de saída do governo. Dizem que foi por causa dessas declarações suas sobre os "pequenos traficantes". O governo nega. Li no blog de Reinaldo Azevedo que o que motivou sua saída foram fatos ligando ele aos dossiês petistas.

Bem, seja qual for o motivo, saibam que uma política minimizadora das penas contra o tráfico está sendo elaborada pelo governo federal. Para redigi-la, talvez tomem como exemplo a realidade estrangeira, que pode não funcionar aqui, por inúmeros motivos.
Na minha opinião, a pretendida minimização da pena não objetiva o combate ao tráfico, mas à diminuição dos custos operacionais da polícia, do Judiciário, dos presídios e suas construções. É uma política econômica e não de combate às drogas.

Após escrever este post, fiz uma pesquisa na internet e encontrei essa entrevista sobre a descriminalização da maconha na Holanda. Sempre é bom "ouvir" quem está de fora. Acesse o link.

(a foto foi extraída do blog Zombeteiro)

6 comentários:

  1. Que singular...

    A policia já tem dificildade em pegar alguns traficantes em flagrante porque alguns carregam consigo crack suficiente para se passar por usuário e só levar um termo circunstanciado. Ou então pedem para um menor de idade se fazer dono da droga aprrendida.

    E quanto a ser "problema localizado", chega a ser surreal dizer tal afirmação. Se em uma cidade como Tubarão-SC chega a ter - pelo que li em noticias policiais do jornal da cidade - ao menos 2 pontos de venda de drogas por bairro, imagina a cidade de São Paulo... E a própria cidade de Imbituba, só nos últimos anos li literalmente dezenas de traficantes sendo presos em bairros diversos.

    Bem, de fato há mutos "indivíduos que atuam no tráfico para sustentar o próprio vício". É uma medida paliativa só jogá-los na cadeia, mas fazer menos que isso vai piorar a situação global que já não é boa.

    EUA teve uma epidemia de crack na década de 80 e o que fez para controlar a situação foi tomar medidas mais duras, tanto contra os traficantes quanto os usuários de crack. E não minimizá-las.

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  2. Acredito que a resposta para este post esteja na última resposta da entrevistada na matéria sobre a Holanda.

    Segundo ela, "a chave para o sucesso da Holanda, além da descriminalização, é um programa forte de prevenção, de tratamento e um sistema de saúde eficaz, que cobre quase toda a população". Isso graças ao fato da Holanda ser rica em recursos financeiras.

    No Brasil não há nada disso. E não é por falta de recursos financeiros, aliás, o governo arrecada mais de 1 trilhão em impostos por ano. Mas, o que esperar de um governo que o maior investimento é em marketing?

    Enfim, não será fácil acabar com o tráfico ou então com essa epidemia de crack, mas, o Brasil poderia seguir o exemplo de quem está sendo bem sucedido no assunto, como a Holanda, claro que com a ressalva de que a entrevistada alerta: "A política antidroga de um país deve ser moldada a sua realidade, muito mais do que importada de outro lugar".

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  3. Matheus, como costumo dizer, o que funciona na casa de alguém, pode não funcionar na minha, por "n" motivos. E você acertou sobre isso. Num país em que o tráfico de entorpecentes coopta muitos funcionários públicos (policiais, políticos, juízes, etc.), a primeira coisa a fazer é limpar a casa.

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  4. Pena,

    sem projetos, debates e lançamento de campanhas educativas tudo fica moroso.
    A meu ver, os traficantes, pequenos ou grandes devem ser processados.
    O consumidor deveria ser tratado, porque trata-se de uma doença.
    Falam muito, e fazem pouco....

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  5. Paulo, sabemos que o tráfico e o consumo de drogas é um mal que nunca será extirpado, mas são necessárias e urgentes políticas de controle.

    Se doentes de outras patologias não conseguem acesso ao precário sistema de saúde brasileiro, não acredito que em menos de 30 anos se conseguirá estabelecimentos públicos para tratamentos de usuários de droga. A esperança, porém, está nos testes de vacinas que estão sendo realizados em vários países.

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  6. Pena,

    acredito que se plantando uma semente, mas um plantio verdadeiro, e regar-se esta semente, ela se desenvolveria e rápidamente: Verba existiria para este início, e o Brasil começaria dando um exemplo mundial, explico:
    Um parlamentar na França ganha 6.952,91 € (15.000 reais), sem esquecer de que o custo de vida la é, em média 40% maior do que no Brasil, sendo que o total com os abonos e adicionais salariais dos parlamentares franceses não chegariam a 80.000 reais e aqui chegam a 250.000 reais. Com a diferença paga a mais por parlamentar no Brasil de 170.000 reais por mês seria uma economia de aproximadamente 250.000.000 por MÊS (daria para plantar várias sementes contra as drogas, e diminuir em mais de 50% a violência decorrentes deste mal!
    Falta movimento neste país neste sentido e em tantos outros...

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