Decisão no STF pela inconstitucionalidade dos Termos Circunstanciados lavrados pela Polícia Militar

Publicarei a seguir o conteúdo da decisão que declarou inconstitucional a lavratura de Termo Circunstanciado pela Polícia Militar do Estado do Amazonas, mas que repercute em todo o País.

Neste post, apenas publicarei o acórdão (os grifos são meus). Até o fim deste mês espero ter tempo para discorrer sobre as consequências jurídicas dessa decisão e das consequências práticas da lavratura dos TCs pela Polícia Militar.

Em 10/05/13 houve trânsito em julgado da decisão e, em 15/05/13, ocorreu a baixa definitiva dos autos ao Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 702.617 AMAZONAS
RELATOR :MIN. LUIZ FUX
RECTE.(S) :GOVERNADOR DO ESTADO DO AMAZONAS
RECTE.(S) :PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DO AMAZONAS
PROC.(A/S)(ES) :PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DO AMAZONAS
RECTE.(S) :ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO AMAZONAS
ADV.(A/S) :VANDER LANN REIS GOES E OUTRO(A/S)
RECDO.(A/S) :MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO AMAZONAS
PROC.(A/S)(ES) :PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO AMAZONAS

RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE PERANTE O TRIBUNAL DE JUSTIÇA LOCAL. LEI ESTADUAL Nº 3.514/2010. POLÍCIA MILITAR. ELABORAÇÃO DE TERMO CIRCUNSTANCIADO. IMPOSSIBILIDADE. USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA. ATRIBUIÇÃO DA POLÍCIA JUDICIÁRIA – POLÍCIA CIVIL. PRECEDENTE. ADI Nº 3.614. INVIABILIDADE DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO.

1. A repercussão geral pressupõe recurso admissível sob o crivo dos demais requisitos constitucionais e processuais de admissibilidade (art. 323 do RISTF).

2. Consectariamente, se o recurso é inadmissível por outro motivo, não há como se pretender seja reconhecida “a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso” (art. 102, III, § 3º, da CF).

3. O Plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu, ao julgar a ADI nº 3.614, que teve a Ministra Cármen como redatora para o acórdão, pacificou o entendimento segundo o qual a atribuição de polícia judiciária compete à Polícia Civil, devendo o Termo Circunstanciado ser por ela lavrado, sob pena de usurpação de função pela Polícia Militar.

4. In casu, o acórdão recorrido assentou:
ADIN. LEI ESTADUAL . LAVRATURA DE TERMO CIRCUNSTANCIADO DE OCORRÊNCIA. COMPETÊNCIA DA POLÍCIA CIVIL. ATRIBUIÇÃO À POLÍCIA MILITAR. DESVIO DE FUNÇÃO. OFENSA AOS ARTS. 115 E 116 DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL. AÇÃO DIRETA JULGADA PROCEDENTES.

- O dispositivo legal que atribui à Polícia Militar competência para confeccionar termos circunstanciado de ocorrência, nos termos do art. 69 da Lei nº 9.099/1995, invade a competência da Polícia Civil, prevista no art. 115 da Constituição do Estado do Amazonas, e se dissocia da competência atribuída à Polícia Militar constante do art. 116 da Carta Estadual, ambos redigidos de acordo com o art. 144, §§ 4º e 5º, da Constituição Federal.

5. O aresto recorrido não contrariou o entendimento desta Corte.

6. Recursos extraordinários a que se nega seguimento.

DECISÃO: Trata-se de recursos extraordinários interpostos pelo GOVERNADOR DO ESTADO DO AMAZONAS, PELO PROCURADORGERAL DO ESTADO DO AMAZONAS e pela ASSEMBLEIA
LEGISLATIVA DO ESTADO DO AMAZONAS, todos com fundamento no disposto no artigo 102, III, a, da Constituição Federal, contra acórdão prolatado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas, assim ementado (fl. 158):

ADIN. LEI ESTADUAL. LAVRATURA DE TERMO CIRCUNSTANCIADO DE OCORRÊNCIA. COMPETÊNCIA DA POLÍCIA CIVIL. ATRIBUIÇÃO À POLÍCIA MILITAR. DESVIO DE FUNÇÃO. OFENSA AOS ARTS. 115 E 116 DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL. AÇÃO DIRETA JULGADA PROCEDENTES.

- O dispositivo legal que atribui à Polícia Militar competência para confeccionar termos circunstanciado de ocorrência, nos termos do art. 69 da Lei nº 9.099/1995, invade a competência da Polícia Civil, prevista no art. 115 da Constituição do Estado do Amazonas, e se dissocia da competência atribuída à Polícia Militar constante do art. 116 da Carta Estadual, ambos redigidos de acordo com o art. 144, §§ 4º e 5º, da Constituição Federal.
Na origem, o Procurador Geral de Justiça, ajuizou ação direta de inconstitucionalidade cujo objeto é o inciso VIII, § 3º, da Lei 3.514/2010, do Estado do Amazonas, que prevê a possibilidade da Polícia Militar, no âmbito de sua jurisdição, confeccionar Termo Circunstanciado de Ocorrência. Asseverou que o disposto contido no mencionado inciso viola a Constituição Estadual, pois ao tratar sobre segurança pública, consoante determinação da Carta Magna, disciplinou e organizou as Polícias Civil e Militar, exatamente como balizada na Constituição.
Sustentou que “ao atribuir à Polícia Militar a elaboração de Termo Circunstanciado, invadiu a esfera de competência da Polícia Civil” (fl. 05).
O pedido foi julgado procedente alegando-se a usurpação de competência, consoante ementa supra mencionada.
Opostos embargos de declaração, foram rejeitados. 
Na sequência houve interposição de recursos extraordinários.
Nas razões recursais do Governador do Estado do Amazonas, bem como do Procurador-Geral do Estado do Amazonas, sustenta-se a violação ao artigo 144, §§ 4º, 5º e 7º, da Constituição Federal, sob o
fundamento de que a elaboração de Termo Circunstanciado pela Polícia Militar não é trabalho investigativo, mas sim simples registro de fatos.
A Assembleia Legislativa do Estado do Amazonas, nas razões do apelo extremo, aponta violação ao artigo 144, §§ 4º, 5º e 7º, sustentando, em síntese que “cabe às Polícias Militares a preservação da ordem pública,
competência ampla e que engloba, inclusive, a competência específica dos demais órgãos policiais” (fl. 273).
É o relatório.

DECIDO.
Ab initio, a repercussão geral pressupõe recurso admissível sob o crivo dos demais requisitos constitucionais e processuais de admissibilidade (art. 323 do RISTF). Consectariamente, quando a ofensa for reflexa ou mesmo quando a violação for constitucional, mas necessária a análise de fatos e provas, não há como se pretender seja reconhecida a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso (art. 102, III, § 3º, da CF).
O Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar a ADI nº 3.614, que teve como redatora para o acórdão a Ministra Cármen Lúcia, pacificou o entendimento segundo o qual a atribuição de polícia judiciária compete à Polícia Civil, devendo o Termo Circunstanciado ser por ela lavrado, sob pena de usurpação de função pela Polícia Militar. Na oportunidade o acórdão restou assim ementado:

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. DECRETO N. 1.557/2003 DO ESTADO DO PARANÁ, QUE ATRIBUI A SUBTENENTES OU SARGENTOS COMBATENTES O ATENDIMENTO NAS DELEGACIAS DE POLÍCIA, NOS MUNICÍPIOS QUE NÃO DISPÕEM DE SERVIDOR DE CARREIRA PARA O DESEMPENHO DAS FUNÇÕES DE DELEGADO DE POLÍCIA. DESVIO DE FUNÇÃO. OFENSA AO ART. 144, CAPUT, INC. IV E V E §§ 4º E 5º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. AÇÃO DIRETA JULGADA PROCEDENTE.

Especificamente sobre o tema, colhem-se trechos dos votos dos ministros:

O problema grave é que, antes da lavratura do termo circunstanciado, o policial militar tem de fazer um juízo jurídico de avaliação dos fatos que lhe são expostos. É isso o mais importante do caso, não a atividade material de lavratura. (Ministro Cezar Peluso). A meu sentir, o Decreto, como está posto, viola claramente o § 4º do artigo 144 da Constituição Federal, porque nós estamos autorizando que, por via regulamentar, se institua um substituto para exercer a função de polícia judiciária, mesmo que se transfira a responsabilidade final para o delegado da Comarca mais próxima.
Isso, pelo contrário, a meu ver, de exceção gravíssima na própria disciplina constitucional. (Ministro Menezes Direito).
Parece-me que ele está atribuindo a função de polícia judiciária aos policiais militares de forma absolutamente vedada pelos artigos 144, §§ 4º e 5º da Constituição. (Ministro Ricardo Lewandowski).
Observe-se que o aresto recorrido não divergiu do entendimento desta Corte.
Ex positis, NEGO SEGUIMENTO aos recursos extraordinários, com fundamento no artigo 21, § 1º, do RISTF.
Publique-se.
Brasília, 28 de agosto de 2012.
Ministro LUIZ FUX
Relator

4 comentários:

  1. Finalmente as coisas estão sendo colocadas nos devidos lugares. Polícia Preventivo/Ostensiva deve estar nas ruas nas 24 horas do dia para nos prestar o velho e bom policiamento de quarteirão. Se esses servidores virem alguma conduta que em tese infrinja a lei devem dar voz de prisão em flagrante aos infratores e imediatamente apresenta-los à única autoridade policial, o DELEGADO DE POLÍCIA e este sim irá decidir o que será feito, garantindo-se deste modo os direitos individuais constantes de nossa Carta Política.
    Igualmente ainda há outra conduta grave e DELITUOSA dessas polícias ostensivas quando membros das mesmas se disfarçam de cidadãos comuns do povo e junto com o MP USURPAM prerrogativas da autoridade policial única, o Delegado de Polícia e da própria Polícia Judiciária, ÚNICA constitucionalmente autorizada a investigar crimes. Investigação conduzida por agentes do MP junto com membros das polícias ostensivas são, gostem ou não, condutas criminosas.

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    Respostas
    1. Infelizmente, Sr. Jorge, a nossa população não sabe sequer quais as atribuições legais de cada polícia. E, por ser assim, fica fácil usurpar funções, já que o cidadão está alheio a tudo isso, na credulidade que nutre em esperar melhor serviço, independentemente de quem o faça. Pobre cidadão brasileiro!

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    2. Parabéns irmão : . Jorge Loeffler, venho aqui me manifestar somente para elogiar vosso excelente comentário que dignifica todos no meio jurídico e também todos os operários que a cada dia desbastam a pedra bruta.

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  2. Jorge Loeffler

    O Sr nem deixou espaço para eu assinar...

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